OFICIO Nº 5/2017
A.DIRECÇÃO/Lisboa, 04-10-17

Nos últimos anos, a situação na Arqueologia e Património foi caracterizada, como noutras áreas da Cultura, por uma brutal ofensiva. E o Governo PS, com a proposta de Orçamento de Estado 2018, não revela qualquer perspectiva de viragem na política seguida. A desvalorização do sector cultural prevalece.

Trabalhar em Arqueologia é sinónimo de precariedade e salários baixos. É contínuo o intenso ataque aos direitos laborais e sociais dos trabalhadores, que este Orçamento de Estado volta a camuflar. Uma elevada percentagem do trabalho arqueológico é desenvolvido por profissionais a «falsos recibos verdes» – e isto é uma realidade vivida nos sectores privado e público. Sem oportunidade de acesso a contratos laborais, o trabalhador sofre recorrentes dificuldades, debatendo-se com elevadas e desproporcionais prestações à Segurança Social face aos seus rendimentos, bem como com a consequente falta de direito a subsídios extraordinários ou à inclusão efectiva no sistema previdencial. É-lhe negado o direito a subsídios de Férias e Natal. São-lhe negados quaisquer apoios ou benefícios sociais. Vê-se sem apoio no âmbito da Saúde, Higiene e Segurança no trabalho. Para além de ver todos estes direitos negados, o trabalhador está ainda sujeito ao frequente atraso no pagamento de salários, ao trabalho não remunerado como horas extraordinárias ou fases de produção de relatório não pagas, bem como ao não pagamento de materiais de trabalho e de despesas de deslocação. Vive-se um período marcado pela indignidade e pela desvalorização das profissões ligadas ao Património.

Relembre-se, o Património Cultural de um povo é um marco fundamental da sua Identidade e Continuidade. Ser e Pertencer. A constante memorização sobre quem somos e de onde viemos. Esta «realidade de nós […] que na origem se gera», tarefa fundamental, plasmada na Constituição da República Portuguesa (artº 9), é uma tarefa diária para os profissionais de Arqueologia e do Património Cultural.

Todavia, nem os trabalhadores de Arqueologia com vínculo ao Estado deixam de sofrer graves ataques aos seus direitos. É alarmante a contínua e crescente situação de envelhecimento, não-rejuvenescimento e agravamento do deficit dos recursos humanos nos organismos públicos dependentes do Ministério da Cultura, tanto ao nível técnico e científico como a nível do atendimento ao público. Insiste-se na política de esvaziamento de meios humanos e materiais. E esta política tem consequências. O Orçamento prevê o controlo absoluto de novos recrutamentos para o Estado com poucas ou nenhumas entradas. Esta dramática situação ao nível dos recursos humanos em todos os serviços, mas muito especialmente em Museus e Palácios Nacionais faz com que estes vejam desta forma ameaçada a continuação do seu funcionamento. Atente-se uma vez mais para o noticiado problema, de base orçamental, a que se assiste no CNANS (Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática). Um problema gravíssimo de falta de recursos financeiros e humanos que acarreta consequências dramáticas para o Património Cultural Subaquático.
Citem-se ainda casos como Museu Dr. Joaquim Manso no Sítio da Nazaré, uma estrutura gerida pela Tutela, que embora tenha vindo a ver aumentado o número de visitantes, não apresenta actualmente as condições mínimas para se manter aberto ao público durante os fim-de-semanas. A esta privação de fruição cultural, acresce a evidente degradação estrutural do edifício, que coloca em risco eminente o património que este alberga.

No Património Imóvel, a situação é gritante. Anos de abandono e de falta de investimento implicam agora a urgente realização de acções de limpeza, consolidação, recuperação e valorização um pouco por todo o país, sob pena de se perder para sempre uma enorme riqueza, herança de todos nós. É preciso um Plano de Emergência que dê resposta à enorme dimensão das necessidades neste campo. A opção de venda a retalho do nosso Património tem de acabar. Não é aceitável a alienação indiscriminada de fortes e quartéis classificados, de concessão a privados de monumentos e sítios ou de criação de estruturas de capital público ou público-privado com o claro objectivo de mercantilização da Cultura.

Num processo que, de forma preocupante, decorre sem que estejam minimamente garantidos os parâmetros e as condições técnicas a respeitar nos projectos e obras de adaptação destes monumentos. Pelo contrário, normalmente estas iniciativas gozam de inaceitáveis dispensas de análise técnica e científica e de procedimentos expeditos de licenciamento, sempre à custa da salvaguarda patrimonial.

As políticas levadas a cabo têm vindo a destruir o que existe com o sub-financiamento, a incúria, a venda ao desbarato, a descaracterização de funções, com políticas que dificultaram o estudo e investigação, a fruição, o contacto directo de todos com os bens patrimoniais.

Não é com o enganador aumento do Orçamento de Estado para a DGPC (Direcção-Geral do Património Cultural) que se poderá reverter esta situação. Os valores do OE apresentados como um suposto acréscimo correspondem ao valor estimado para obras na Fortaleza de Peniche; o reforço orçamental previsto para o Parque Arqueológico do Vale do Côa é insuficiente para garantir a mudança de rumo prometida: a da valorização integrada daquela infra-estrutura, prometida pelo Ministério da Cultura e pela Secretaria de Estado da Ciência.

O estado a que os museus, os monumentos, os sítios arqueológicos e o património em geral chegaram desperta-nos uma profunda preocupação. Ressaltamos a necessidade de uma política de valorização da Cultura e dos seus trabalhadores. Mas pelo contrário, o que o Orçamento de Estado para 2018 revela é uma diminuição drástica de investimento neste sector e uma clara ausência de visão estratégica de futuro relativamente a um recurso nacional tão relevante como é o nosso Património Cultural. Tem-se vindo a assistir a um aumento exponencial das receitas, nomeadamente em museus e palácios. Ora, isto revela que a contribuição das finanças públicas todos os anos tem diminuído significativamente.

O desinvestimento do Estado tem reflexos profundos na conservação, divulgação, investigação e democratização do Património. Um Património que é de todos! É preciso proceder ao reforço do financiamento para a Cultura em sede de Orçamento do Estado, tendo como meta urgente 1% do OE.

Atentamente,
STARQ